Escolhendo o tipo societário de sua startup

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Intencionalmente ou por falta de conhecimento, a escolha do tipo societário a ser adotado para a criação de uma startup é geralmente relegada a segundo plano.

Comumente, as startups acabam solicitando ajuda de seus contadores que, por geralmente não possuírem o conhecimento jurídico específico para auxiliar nessa matéria, indicam estruturas que não condizem com a intenção dos sócios ou mesmo a lógica do negócio que pretendem criar. Startups me procuraram mais de uma vez solicitando informações, pois seus contadores haviam indicado a “sociedade em conta de participação” como o tipo societário apropriado para o que pretendiam fazer, o que não se confirmava quando o projeto era analisado do ponto de vista estritamente jurídico.

Além de entender as vantagens e desvantagens, obrigações e direitos de cada tipo societário, é necessário ter em mente que algumas atividades demandam um tipo societário específico em razão da legislação. É o caso, por exemplo, de quaisquer atividades classificadas como reservadas à instituições financeiras, as quais devem ser necessariamente constituídas sob a forma de sociedades anônimas. Outra hipótese importante a ser considerada é o caso de emissão de ações ou debêntures, as quais só podem ser emitidas por sociedades anônimas. Com estes dois exemplos é possível notar a importância da adoção do tipo societário adequado para as atividades que sua startup pretende desenvolver.

Passemos às formas disponíveis para constituição de uma startup. Deixo claro, desde já, que Microempresa e Empresa de Pequeno Porte não são tipos societários, mas definições baseadas no faturamento de empresas constituídas sob os tipos societários definidos como empresários (os quais serão tratados abaixo), a sociedade simples, a EIRELI, o MEI ou o Empresário individual.

O Micro Empresário Individual (MEI) é uma opção para o empresário que exerce a atividade de forma individual, com uma receita bruta de até R$ 5.000,00 no mês ou R$ 60.000,00 no ano. Caso ultrapasse estes valores, passará a constituir o Empresário Individual (EI). Trata-se da estrutura jurídica mais simples para abertura de uma empresa. Neste caso, haverá apenas um Certificado de Condição de Microempreendedor, sendo inaplicável qualquer tipo de contrato ou estatuto social. Vale notar que, neste tipo de organização, não é possível ter sócios uma vez que a empresa está concentrada na figura do microempreendedor e o empresário não possui limitação de sua responsabilidade. Isso equivale dizer que as obrigações assumidas pelo MEI, são obrigações assumidas pela própria pessoa física. Ou seja, se o MEI não tiver bens suficientes para responder por suas obrigações financeiras, os bens da pessoa física deverão responder pelas dívidas.

Além do MEI, também existe a EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada). Assim como o MEI, essa estrutura é formada apenas pela figura do empresário, com o detalhe de que existe a segregação do patrimônio do empresário e o patrimônio da empresa, o que confere a característica de responsabilidade limitada. A responsabilidade limitada é importante principalmente no caso de estabelecer a limitação da responsabilidade assumida pela empresa ao patrimônio dela própria, sem alcançar o patrimônio pessoal do empreendedor, dessa forma limitando seus riscos ao empreender. Neste tipo de organização também fica o empresário impossibilitado de ter sócios pela mesma razão do MEI. Além disso, o capital social deverá ser de, no mínimo, 100 vezes o maior salário-mínimo vigente no País. Por fim, o empresário poderá possuir apenas uma EIRELI, sendo vedada a criação de outras EIRELIs.

Além dessas, também podem interessar aos startupeiros a constituição sob os tipos societários da sociedade simples, limitada, sociedade em conta de participação e sociedade anônima. Com exceção da sociedade simples, são as chamadas sociedades empresariais.

A Sociedade Simples é o único tipo societário que admite o sócio de indústria. O sócio de indústria é aquele que não contribui com dinheiro para o capital social da sociedade, mas contribui com o seu trabalho. Apesar dessa vantagem, é importante ter em mente que a Sociedade Simples não se submete ao regime jurídico empresarial pois é entendida como uma sociedade não-empresária. Isso significa dizer que a ela não serão estendidos quaisquer benefícios que possam ser aproveitados pelas sociedades empresárias como, por exemplo, o regime de falência e recuperação judicial.

A Sociedade Limitada é um dos tipos societários mais utilizados no Brasil. Sua principal característica é a limitação da responsabilidade dos sócios, conforme a definição descrita anteriormente. Neste caso, a empresa será constituída por 02 ou mais sócios, regidos por um contrato social. O contrato social é o documento que definirá a relação dos sócios e as “regras” pela qual a sociedade vai se constituir, devendo ser registrado na Junta Comercial do Estado. Neste tipo societário é possível elaborar documento para orientar os votos dos sócios, o acordo de quotistas.

A Sociedade em Conta de Participação possui particularidades em relação aos demais tipos societários apresentados até o momento. Este tipo societário é marcado pela responsabilidade ilimitada daquele sócio que se apresenta como sócio ostensivo (aquele sócio que pratica as atividades da empresa em seu próprio nome). Este tipo societário tem como principal característica o sigilo – os demais sócios são “ocultos” (de forma que estes não aparecem no curso dos negócios realizados com terceiros) e os atos societários dessa modalidade não são registrados, embora seja uma sociedade empresária. Todas essas características fazem com que este tipo societário não possua personalidade jurídica própria. Nesse caso, os sócios participantes possuem obrigações somente para com o sócio ostensivo, o qual, por sua vez, assume as obrigações com terceiros em seu próprio nome.

Por fim, a Sociedade Anônima é geralmente associada a estruturas mais complexas. A Sociedade Anônima possibilita a elaboração de acordos de acionistas, emissão de debêntures (forma de financiamento por meio de emissão de títulos de dívida da empresa), abertura de capital ao mercado financeiro, oferece uma estrutura de governança mais robusta (a administração da companhia pode ser composta por uma Diretoria e um Conselho de Administração), existe previsão legal que obriga a distribuição de dividendos mínimos obrigatórios, dentre outras regras aplicáveis a este tipo societário. Este tipo societário também prevê a limitação da responsabilidade de seus sócios.

Além dos tipos societários descritos neste artigo, também existem outros que não foram mencionados por serem menos utilizados ou por não terem grande relevância para o cenário das startups. São eles a sociedade em nome coletivo, a sociedade em comandita simples e a sociedade em comandita por ações.

Para finalizar, existem formas de organização que são comumente denominadas de sociedades de propósito específico (SPE). Essa tipologia surgiu em virtude do regime jurídico criado para as parcerias público-privadas no setor de infraestrutura, por meio da Lei nº 11.079/04. Ocorre que, na prática, o mercado acaba tratando as sociedades de propósito específico de forma diversa da que foi originalmente imaginada pela Lei. O mercado entende como sociedade de propósito específico aquela sociedade criada para atender a um negócio específico e isolar um ativo das demais atividades realizadas por uma empresa, sendo geralmente utilizado o tipo societário da limitada ou sociedade anônima para este fim – é o caso, por exemplo, de uma empresa “A” que cria um app e deseja segregá-lo e colocá-lo sob a tutela de uma empresa específica, criada simplesmente para desenvolver as atividades relacionadas a este aplicativo. Isso significa que a venda do aplicativo não terá vínculos diretos com a empresa “A” e o aplicativo fica imune de quaisquer problemas que possam surgir em virtude das atividades desenvolvidas pela empresa “A”. No momento de venda do app a um investidor ou qualquer empresa que deseje comprá-lo, será mais fácil definir a participação de cada um na SPE, distribuir o valor obtido com a venda de acordo com a participação dos sócios na SPE e, inclusive, efetuar uma venda de “porteira fechada” da SPE (vende-se a SPE junto com todos os seus ativos e passivos). Note que uma SPE pode ser constituída de diversas formas dentre os tipos societários descritos anteriormente.

Dessa forma, vale a pena investir um tempo planejando a estrutura a ser adotada para a constituição de sua startup. Todo tipo societário possui vantagens e desvantagens juntamente com obrigações e direitos específicos que devem ser avaliados na hora de escolher a forma pela qual a startup será constituída.

Caso tenha quaisquer comentários, dúvidas, deseje aprofundar-se no assunto ou busca assessoria jurídica, por favor, envie um e-mail para norru@hotmail.com.

2 thoughts on “Escolhendo o tipo societário de sua startup

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